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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

O canto do Sabiá do Bispo

Beleza germânica, bem que deseja
aliviar a morbidez suástica
e abrandar o grito de 6 molhões
de almas, mas não faz esquecer...

Testemunha tácita
dos passeios espectrais do bispo
sem cabeça
a encantar (encontrar)
o crepúsculo
e assustar os tralhotos
nas ondinhas que levam
as areias doces da praia um tanto
pedregosas, cheia de capinzais
que servem de refúgio
às hostis arraias.

Postais da ilha,
arquitetura antiga, dos tempos
de antigamente de uma vila
já centenária, teu ocre combina
com a cor das areias, lembrando
páginas de um livro antigo.

O conjunto todo combina:

casaescadariacolunascoqueiros
palmeirasquadrapostesberrancosbarracas
areiaareiapedracapins...Pessoas.

Pessoas alegres no bar...
Burburinho de vozes e risos ancetrais
ecoam balbuciantes, dolentes, saudosos...

Dói-me, dói-me bastante o estar-longe-dali.


(Poema de minha autoria dedicado a uma das mais singelas praias de Mosqueiro, onde beleza natural, cultural e histórica combinam-se. Infelizmente, o descaso e a má vontade política condenaram-na ao quase-ostracismo, por causa de "burrice administrativa crônica", principalmente no que diz respeito à exploração turística e racional ( sem presença de quiosques, boa música, caramanchões, brinquedos...) de sua orla (com muro de arrimo histórico datado de 1936), que deveria ser revitalizada e aproveitada para gerar receita para a gente de nossa terra, e ser lazer seguro e calmo para quem nos visita. É, é isso!)

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Uma ponte entre o hoje, o ontem e o amanhã

A ponte quase que somente liga hoje o Mosqueiro ao nada,
Pronunciam alguns... nada disso: é uma voz do passado, cochichando
Ao nosso ouvido: “Não deixem morrer nossas memórias!”
E, se é uma ponte de memórias, um trapiche de lembranças,
É também um convite a um mergulho, de um salto rápido,
Não só nas águas da Baía de Marajó, mas uma imersão
Nas águas passadas do tempo e do espaço, sob e em frente
Deste monumento erigido por ingleses em 06/09/1908.
Cem anos de nascimento, cem anos de ir-e-vir de pessoas...
E nada de batismo, um monumento anônimo,
Que ergue sua voz secular, vinda com os ventos ancestrais
Da Belle Époque Paraense, que o Ciclo da Borracha
Fez passear em trajes afrancesados e arquitetura requintada,
Da melancólica praia do Bispo até o doce recanto do Ariramba...
A transfusão de tempos nos vislumbra esta Ponte, pontas atadas
De um século e outro, do outrora ao agora, a lembrar
Que seu parto coincidiu com a chegada dos estrangeiros da Amazon River,
Da Port of Pará e Pará Eletric Railways Company,
Construtores dos chalés da orla de nossa bela Ilha.
Antônio Lemos ressuscita em nossa memória mosqueirense,
E esta ponte que não liga margem a outra ― liga tempo e memória―
Já testemunhou a atracação de centenas de navios-fantasmas...
Ponte a interligar a Ilha do agora àquela do outrora, do fim
Do Ciclo Áureo da Borracha, trapiche, atracadouro onde aportaram
Personagens navais que jamais devem mergulhar nas águas
Barrentas da desmemória: o vapor Gaivota, o mais antigo
Na linha Belém-Mosqueiro-Belém. A lancha Tucunaré, o saudosíssimo
Almirante Alexandrino, o Lobo Dalmada, o Lauro Sodré, o belo,
Luxuoso e elegante Presidente Vargas. Ei, psiu! Acorde de seu sono,
Sob estas águas! Mas... é impossível...
Muitas águas passadas, e o trapiche ainda sobrevive em seu eterno
Retorno de tentativas com outras embarcações: Otávio Oliva, Capitariquara,
Mazagão... E hoje, esporadicamente, surge nos horizontes da Baía
De Santo Antônio, como um mito vivo, eis de novo o intendente,
Antônio Lemos, um retorno ao passado, mesmo que raro, muito raro.
Importa é que nosso secular monumento anônimo ainda
Sobrevive, sem projetos, sem nome sequer, apesar de não ser mais
Metálico, ser de madeira, em estado de decadência que dá dó de ver...
Mas é um sobrevivente teimoso. Por isso venceu a outros, já extintos.
Na sua inglória luta temporal, sobreviveu aos trilhos do Ferril-Carril,
ao Cine Guajarino, ao Bonde Pata Choca.
Nasceram a Rádio Nacional, o Estado Novo. Veio Magalhães Barata,
eclodiram duas guerras mundiais, nasceu Brasília e a Rodovia
Belém-Brasília,chegaram os mega projetos desenvolvimentistas amazônicos,
O Milagre Brasileiro trouxe-nos a PA-391 e a Ponte Belém-Mosqueiro
― para ofuscar o trapiche.
Veio a energia de Tucuruí, espantando visagens e assombrações...
O trapiche, caprichosamente, ainda está de pé, por assim dizer,
À revelia da ausência de projetos de melhoria de vida para a gente daqui da Ilha.
As águas passadas e as atuais não destruíram o trapiche anônimo:
As do futuro, então, o farão?
Ponte sem função? Não: perdeu uma função e ganhou outra: os namoros em flor!
O guerreiro já velho, cansado e calejado, de muitas batalhas, tanto ganhas
Quanto perdidas ― sem mais nenhuma por vencer―, talvez não queira mais,
Do mundo e das pessoas, nada mais que se mantenha dele, na memória,
Os tempos de glória, para o eternizarem. Jamais deseja o esquecimento,
Pois o esquecimento, este sim, significa a morte.


(Poema de minha autoria em homenagem ao centenário do trapiche, monumento sem nome, lido ali na rampa, em evento organizado pela Escola Honorato Filgueiras, em 06/09/2008)

A ponte de ferro (o trapiche) da Vila, de 1908, projeto de engenharia inglesa

Foto antiga da atual Praça Cipriano Santos (Matriz), fronteiriça à outra, Praça Princesa Isabel, na Vila, em Mosqueiro

Cartão postal da Praça da Matriz de Mosqueiro (início do séc XX), que na verdade, hoje é Praça Cipriano Santos, ao lado da Praça Princesa Isabel.

Pedaladas na Ilha

Fôlego
Falecendo
neste pedal girando:
força, for-ça, f-o-r-ç-a...
O asfalto, como esteira rolante,
escapulindo para trás...
O tempo na frente
diante de meus olhos,
e o pneu dianteiro
bebendo a distância,
encurtando o futuro
― ali, quase a fugir da tentativa
de apanhá-lo com as mãos
(apesar de estarem
seguras
no guidom) ―
...
O vento inunda os olhos
de cores, a endoidecer a razão,
no fluxo contínuo das pedaladas:
trôpegos passos de pé redondo,
levitando sobre o solo esburacado da Ilha
― em direção à praia à luz ao sonho ao arco-íris... ―,
em busca de uma bateia mágica
garimpar num veio etéreo
todas as minhas líquidas utopias
que subjazem latentes, mas não se desfazem,
emergindo, mesmo que volatilmente,
e me arrastando até a linha do horizonte,
onde, por fim, descansarei...


(Em homenagem a todos os "pés redondos" mosqueirenses, aqueles que optam por um transporte saudável e limpo)