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domingo, 30 de maio de 2010

Morubiras ― o início do fim

Na camboa,
em meio à névoa
da manhãzinha preguiçosa,
o índio morubira
recolhe o peixe, o camarão,
o siri...
Os curumins-filhos o ajudam
nesse labutar cotidiano, sem muriçocas
para atazanar a paciência.

Cunhã-esposa, no estirão da areia
recolhe sementes
na companhia das cunhãs-filhas.
Também juntam tabatinga vermelha
para pintar o corpo
pra festa que aí vem.

O mar-baía, cinza...
O céu, cinza...
A névoa, branquidão
que oculta o bege
da areia praieira,
onde a lenha já está
distribuída enfileirada
em montes a espaços
pela extensão da enseada.

O verde renasce por trás
da brancura a se dissipar, aos poucos.
O guerreiro-pescador morubira
já sente antecipadamente
o cheiro do peixe no moqueio,
o sabor do beiju,
do peixe apimentado,
do cauim inspirador.
Seus sentidos todos despertos,
já antevê ali
seu povo em festa, cantando
e dançando feliz,
na realização de seus rituais.

Um trovão, dois, três e mais,
― com um ribombar repetido e assustador ―,
despertam de sua reflexão o índio.
Em um átimo, a paisagem
ganha espessas pinceladas de vermelho.
O mundo explode em sangue
diante do guerreiro: a tribo
covardemente atacada
― velhos, crianças, mulheres,
algumas grávidas,
atravessadas a espada, ou
já atingidas pelos tiros.

Sua família, sua tribo,
todos
vítimas de algozes gananciosos,
sedentos por terras,
e pelas riquezas que delas
se pode extrair.
Veloz, o guerreiro tupinambá
corre destemido rumo aos seus
e ouve um trovão ― não, não é de Tupã!
Dor, insuportável dor!...
Diante de seus olhos, a última visão:
o chão e a escuridão.

O nada destruidor passou a imperar
na Enseada dos Morubiras...
(de minha autoria)


Disponível em: luizmalvino.blogspot.com. Acesso em:11/07/2010.

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