Faces do ser
O artista tenta expor, mal o
consegue. Aliás, bem que o consegue, mas só ele sabe, só ele, e pessoas
próximas que o auxiliaram na empreitada, têm o efetivo conhecimento das imensas
dificuldades que houve, e que com certeza o farão pensar três (ou quatro,
cinco, seis vezes) antes de sonhar em de novo expor seus quadros.
Devido ao tratamento de certo modo
caprichoso dado à sua exposição, ficou-nos o texto de seu folder, bela mostra de suas obras miniaturizadas, grande parte em
preto e branco, acompanhadas de um texto explanatório de sua intenção com a
mostra. Vale a pena conferir o texto, que segue, para seu deleite:
“Conta o mito grego que a Esfinge ―
monstruoso ser híbrido, com corpo de leão, asas de águia e rosto de mulher ― ao
jovem Édipo compeliu-o à decifração do seguinte enigma: Qual é o animal que de
manhã anda sobre quatro patas, ao meio-dia, sobre duas e, à noite, sobre três?
Édipo refletiu bastante antes de responder, pois era sua vida que estava em
jogo, uma aposta que não poderia perder, pelo motivo óbvio de que não teria
direito à revanche, uma vez que, assim, devorado pela Esfinge
(irremediavelmente morto, portanto), não poderia vingar-se. Além disso, havia o
agravante de que o monstro continuaria assolando as cercanias da cidade de
Tebas, por onde o corajoso jovem andarilhava, sem rumo, fugindo de seu
impiedoso fado, já predito pelo Oráculo de Delfos: matar seu pai, casar com a
própria mãe e ter filhos com ela.
Finalmente, Édipo disse: ― É o
homem: durante parte da infância (a manhã, portanto), engatinha; durante a
idade adulta (o meio-dia, lógico), anda ereto, como um bípede que é; já na
velhice (a noite, naturalmente), usa como apoio um cajado ou muleta ou o que lá
for... Era a resposta correta. Humilhada, a Esfinge suicidou-se, atirando-se de
um abismo, deixando-se morrer ao não usar as asas. Outra versão conta que ela
fugiu em desespero dali, para longe da humilhação, onde passou a assolar outras
ermas estradas e ermos viajantes.
Ainda o ser humano é como o
enigma da Esfinge: um ser mutante, mais que a Lua em suas fases, mais que a
borboleta tornando-se larva, a larva tornando-se pupa, a pupa tornando-se
borboleta (novamente). Mais que as estações, uma tornando-se a outra,
subseqüentemente. Isto porque não muda só fisicamente, muda em concepção de
vida, filosofia, religião, política... muda emocionalmente o tempo todo. E se é
bom ou ruim o ser humano ser “esta metamorfose ambulante”, como diria Raul
Seixas, não sei, contudo, podemos ponderar que a mudança é necessária: a
monotonia, o tédio, são (os dois) algo a que o homo sapiens moderno tem verdadeira (mente) repulsa.
Os trabalhos neste catálogo e
na exposição constituem um ensaio e enfocam, por um prisma meramente pessoal
(do autor), este aspecto do ser: mutação (entendida aqui a palavra em seu
sentido mais amplo ― nada é, tudo
apenas está). O mundo e as “coisas”
são impermanentes. Nós, em nossa tão ligeira existência, somos um ser fugaz.
Fugaz até mesmo no modo de encarar a vida: ora alegre, ora triste; ora justo,
ora canalha; ora calmo, ora irritado... É este o ser que somos. Ensaiamos
mostrar, aqui, um pouco de nós mesmos.”
A exposição recebeu por título Faces do ser. Ocorreu em 2004 e teve como obras alguns exemplares reproduzidos abaixo.
A face da musa
A libido masculina
A dor
A clonagem
A contemplação
Cástor e Pólux
El Greco, o atleta
Espelho partido
Alegoria da Caverna
Narciso
Angústia
O abismo da alma
O beijo a contragosto
O beijo das placas tectônicas
O beijo I, ou o homem licantrópico
O beijo II
O homem bicentenário
O homem feio
O maligno
O maligno II
O último dos últimos
Os três contempladores
Por um fio
Simulacro
Sob o signo do olhar I
Sob o signo do olhar II
Só vejo a luz se ela vem de teu olhar
Um acalanto
Bateram asas as palavras
Faces do ser
O artista tenta expor, mal o
consegue. Aliás, bem que o consegue, mas só ele sabe, só ele, e pessoas
próximas que o auxiliaram na empreitada, têm o efetivo conhecimento das imensas
dificuldades que houve, e que com certeza o farão pensar três (ou quatro,
cinco, seis vezes) antes de sonhar em de novo expor seus quadros.
Devido ao tratamento de certo modo
caprichoso dado à sua exposição, ficou-nos o texto de seu folder, bela mostra de suas obras miniaturizadas, grande parte em
preto e branco, acompanhadas de um texto explanatório de sua intenção com a
mostra. Vale a pena conferir o texto, que segue, para seu deleite:
“Conta o mito grego que a Esfinge ―
monstruoso ser híbrido, com corpo de leão, asas de águia e rosto de mulher ― ao
jovem Édipo compeliu-o à decifração do seguinte enigma: Qual é o animal que de
manhã anda sobre quatro patas, ao meio-dia, sobre duas e, à noite, sobre três?
Édipo refletiu bastante antes de responder, pois era sua vida que estava em
jogo, uma aposta que não poderia perder, pelo motivo óbvio de que não teria
direito à revanche, uma vez que, assim, devorado pela Esfinge
(irremediavelmente morto, portanto), não poderia vingar-se. Além disso, havia o
agravante de que o monstro continuaria assolando as cercanias da cidade de
Tebas, por onde o corajoso jovem andarilhava, sem rumo, fugindo de seu
impiedoso fado, já predito pelo Oráculo de Delfos: matar seu pai, casar com a
própria mãe e ter filhos com ela.
Finalmente, Édipo disse: ― É o
homem: durante parte da infância (a manhã, portanto), engatinha; durante a
idade adulta (o meio-dia, lógico), anda ereto, como um bípede que é; já na
velhice (a noite, naturalmente), usa como apoio um cajado ou muleta ou o que lá
for... Era a resposta correta. Humilhada, a Esfinge suicidou-se, atirando-se de
um abismo, deixando-se morrer ao não usar as asas. Outra versão conta que ela
fugiu em desespero dali, para longe da humilhação, onde passou a assolar outras
ermas estradas e ermos viajantes.
Ainda o ser humano é como o
enigma da Esfinge: um ser mutante, mais que a Lua em suas fases, mais que a
borboleta tornando-se larva, a larva tornando-se pupa, a pupa tornando-se
borboleta (novamente). Mais que as estações, uma tornando-se a outra,
subseqüentemente. Isto porque não muda só fisicamente, muda em concepção de
vida, filosofia, religião, política... muda emocionalmente o tempo todo. E se é
bom ou ruim o ser humano ser “esta metamorfose ambulante”, como diria Raul
Seixas, não sei, contudo, podemos ponderar que a mudança é necessária: a
monotonia, o tédio, são (os dois) algo a que o homo sapiens moderno tem verdadeira (mente) repulsa.
Os trabalhos neste catálogo e
na exposição constituem um ensaio e enfocam, por um prisma meramente pessoal
(do autor), este aspecto do ser: mutação (entendida aqui a palavra em seu
sentido mais amplo ― nada é, tudo
apenas está). O mundo e as “coisas”
são impermanentes. Nós, em nossa tão ligeira existência, somos um ser fugaz.
Fugaz até mesmo no modo de encarar a vida: ora alegre, ora triste; ora justo,
ora canalha; ora calmo, ora irritado... É este o ser que somos. Ensaiamos
mostrar, aqui, um pouco de nós mesmos.”