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sexta-feira, 21 de agosto de 2015

A conversão de Saulo

A conversão de Saulo
(Atos 9:1-30)


Saulo vai para Damasco (9:1-9)
- Saulo pediu cartas do sumo sacerdote às sinagogas de Damasco autorizando perseguição contra os cristãos de lá (9:1-2)
- No caminho de Jerusalém para Damasco, ele encontrou Jesus (9:3-6)
- Quando Saulo viu uma luz brilhante no céu, ele caiu por terra
- Uma voz perguntou: "Saulo, Saulo, por que me persegues?"
- Saulo respondeu: "Quem és Tu, Senhor?"
- A voz lhe replicou: "Eu sou Jesus, a quem tu persegues; mas levanta-te e entra na cidade, onde te dirão o que te convém fazer"
- Os companheiros de Saulo ouviram a voz, mas não viram ninguém (9:7)
- Saulo ficou cego, e foi levado para Damasco onde ele ficou três dias sem comer e sem beber (9:8-9)
Disponível em: http://www.estudosdabiblia.net/b03_10.htm. Acesso em 19 out. 2014.

Por causa dessa estória, desse episódio bíblico, lembramos de um outro, registrado em documento achado em uma garrafa de cachaça fechada com uma rolha, encontrada na Praia Grande, há poucos carnavais atrás, contendo um pergaminho raro e antigo, de onde compilamos o texto anônimo abaixo:

Saulo, Saulo!...

Quisera ter eu a inteligência e a sabedoria de Nietzsche, capaz de dizer, e dizer de fato muito, por intermédio de uma linguagem alegórica e por meio de aforismos de invejável acuidade. Como não as tenho, suponho que possa ao menos tentar enveredar por trilhas paralelas e similares. Tentarei, pois...

− Saulo, Saulo!... Por que me perseguis, Saulo?!...  Por que tanto me apedrejais, Saulo?!...
Para vós, é como saborear manjares finos e deliciosos o ato de arremessar pedregulhos em mim, Saulo?
Pois vos digo, Saulo, é fácil apedrejar os telhados de vidro do vosso próximo, Saulo. E sabemos como fazeis bem feito isso, Saulo, e como te apeteceis em fazê-lo, não é mesmo?
Em verdade, em verdade, vos digo, Saulo, os pedregulhos só são ditosos quando o telhado de vidro não é o vosso, Saulo, pois em sendo assim, os pedregulhos não se mostram nada suaves, mas sim doridos, Saulo, e as cicatrizes, os estigmas, Saulo, acompanham a jornada, até a sepultura, daqueles apedrejados...
Ora, quando os pedregulhos são arremessados por vós, Saulo, cada dor dos outros causa em vós, não lamentos, mas gargalhadas, Saulo. Ruim é quando gargalham de vós, quando os estigmas são vossos, Saulo. E bem vos digo: Cada caco do telhado é como uma lágrima vertida por copiosa chuva de dores, Saulo. E não  vos compadeceis nada com isso, bem o sei, Saulo.
Por força de vossa arrogância (sabeis disso muito bem, não é, Saulo?), só podeis ver fragilidade nos telhados dos vossos opositores; entretanto, as fragilidades maiores podem estar a um palmo de distância de vossa cabeça, Saulo, como uma periclitante espada de Dâmocles, a cair iminentemente sobre vosso crânio, a não ser que, cravados no solo de vossa cabeça haja um par de dispositivos que a protejam, Sr. De tarso.
− Saulo, Saulo!... Por que me perseguis, Saulo?!...  Por que tanto me apedrejais, Saulo?!...
Saulo, bem-aventurados os calados, pois não se arriscam a proferir asneiras, Saulo. Quem muito fala, pouco ou quase nada diz, de fato. “Falam demais por não terem nada a dizer”, como meu discípulo Renato Russo já o afirmou peremptoriamente.
E aqueles a quem muito atormentais, Saulo, têm parentes, têm pais, filhos e filhas, vizinhos e amigos, com quem podem contar. E vós, Saulo, podeis contar com essa espécie de rede, Saulo? Em tempos de fartura, é preciso saber o que fazer com as benesses, para poder ter com o que e com quem contar durante as épocas desabençoadas, Saulo.
Quereis muito aparentar que sabeis veementemente separar o joio do trigo, Saulo. Contudo, vós tendes a certeza de que vós não seríeis considerados por outrem como o joio mais resistente, mais parasítico e inútil? É, Saulo, são sempre as más companhias que nos levam à sarjeta, Sr. Apóstolo, ou será que as más companhias não seríeis precisamente vossa pessoa? Ora, não podeis observar tal fato por causa de vosso egocentrismo, de vossa egolatria, de vosso egoísmo e de vossa ganância. Ou estarei errado eu?
Em verdade, em verdade, Saulo, de todas as más qualidades de que sois mui bien dotado, talvez a pior seja a inveja, Saulo. Pois saibais vós, Saulo, que a inveja matou o gato, como muito bem já o disse aquele velho deitado, não é? A inveja faz o boi ver o pasto do outro sempre mais verdejante, e, como não tem espelho, vê os chifres do outro sempre maiores do que os vossos. A inveja faz também a pessoa sempre ver, na garagem do irmão, um veículo mais sofisticado (que o banco pode tomar, inclusive, Saulo!).
− Saulo, Saulo!... Por que me perseguis, Saulo?!...  Por que tanto me apedrejais, Saulo?!...
Saulo, saibais que as opiniões alheias dizem que vós andais muito Bocudo, Saulo! Ah! Uma caba tatu nesse beiço asqueroso, Saulo! Lembrai-vos, Saulo, que outro velho deitado já revelou-nos a perfeita imagem de que o macaco, antes de falar mal do rabo de outro, deveria, primeiramente, observar os defeitos de seu próprio rabo. Fazeis isso, De Tarso? Ou andais esquecido disso?
Lembrai-vos, também, de vosso passado, Saulo. De que partido éreis, mesmo? PC do B? De que partido sois, agora? Do “Venha a Nós, e ao Vosso Reino Nada”? No passado distante, fostes Fariseu. Perseguistes-me e aos meus. Depois, como um camaleão, mudastes radicalmente para vossa oposição: os que antes perseguistes e matastes, agora deles sois aliado ferrenho, desde criancinha, não é mesmo, Saulo?
Ora, hoje criticais o que antes fazíeis, Saulo. Como era vosso apelido, De Tarso? Não era “Saulo Cachaça”? Quanto de dinheiro de dízimo não usastes para comprar uma Tatuzinho, um  Velho Barreiro, uma Oncinha, uma Cachaça Belém? Hoje falais mal de quem bebe. Esquecestes vós até de vossos amigos que dividiram o cárcere convosco?

Não esqueçais vós que há outro velho deitado que reza o seguinte: “O trabalho dignifica o homem.” Pois é, Saulo. Primeiro, trabalhar, trabalhar, de fato, não é atividade que vos apeteceis, não é mesmo? Desde que o mundo é mundo já se sabe que vós não sois chegado às atividades trabalhísticas que engrandecem a mensagem perene de que o ser humano deve merecer o pão de cada dia porque suou a camisa. Para vós, emprego. Para os pobres coitados, trabalho. Para vós, dinheiro no bolso, não trabalho, dignifica o homem.
Em segundo lugar, Saulo, muitos consideram que, para se referirem à vossa pessoa, a palavra ‘homem’ e a locução ‘ser humano’ não são termos apropriados. Os termos adequados seriam os correspondentes às seguintes acepções dicionarísticas: “Invertebrado de corpo mole, semelhante à lombriga; minhoca; gusano; helminte; larva”; ou “animálculo intestinal”; ou, por fim: “aquilo que mina ou corrói lentamente”.

− Saulo, Saulo!... Por que me perseguis, Saulo?!...  Por que tanto me apedrejais, Saulo?!...

Em verdade, em verdade, quem sois vós, agora, Saulo? Quem éreis e quem sereis daqui a um futuro próximo, Saulo? Tereis, ainda, o teu digno emprego, Saulo? Ou estareis trabalhando, finalmente, Saulo?

− Saulo, Saulo!... Em quem ou em que vos convertestes?

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